20ª Semana Nacional dos Museus

20º Semana Nacional dos Museus, conferência proferida por Gustavo Sobral,  Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, Natal/RN, 21 de maio de 2022

Museu de tudo

É preciso que eu mesmo me identifique, antes de começar, e que diga o que pretendo dizer e como me preparei para fazê-lo.

Devo dizer, a priori, que não sou museólogo, portanto, não sou um especialista, embora já tenha tido a satisfação de ter sido diretor de um museu, o mais antigo do Rio Grande do Norte, aqui ao nosso lado, o museu do Instituto. E já visitei diversos.

E aconselho, um primeiro e único conselho: visitem museus e procurem colher as suas próprias impressões. Visitar museus é uma forma de conhecer o mundo. E há diversos tipos de museus, devo dizer, há os que colecionam obras de arte, os dedicados à fotografia, moda, cinema, telefone, tudo cabe em um museu.

Assunto sobre o qual eu poderia passar horas e horas conversando. Mas como não temos este tempo, e, por isso, escrevi algo que gostaria de dividir com vocês, nesta conferência, acerca do tema. Preparei um texto curto, que é este que leio.

Mas antes de entrar no assunto, deixem-me antes dizer da satisfação de ter sido convidado para mais uma vez falar nesta casa, a chamada Casa da Memória, Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

O Instituto é a mais longeva instituição cultura do Rio Grande do Norte. Completou 120 anos agora em 2022 e abriga um acervo tripartite: é biblioteca, é arquivo, é museu. E é, portanto, sobre um tema caro ao Instituto, o museu, que me ocuparei nesta 20º Semana Nacional dos Museus. Feito este preâmbulo, passo à pequena e breve conferência.

Estamos em 2022, há exatos 120 anos de fundação desta casa, e é de admirar que no Brasil e no Rio Grande do Norte, país e Estado de tradições tão recentes, uma instituição como esta enfrente tantas mudanças no tempo.

O Instituto nasce na república e já enfrentou inúmeras transformações de ordem política e cultural e aos trancos e solavancos do tempo veio se mantendo sólido. Mas não será este o tema da minha conferência. Quero me dedicar ao tema que me foi proposto, o museu.

É preciso, primeiro, apresentá-lo. O museu é um espaço cultural e pelas contas já existem mais de 80 tipos diferentes de museus. Há o museu de arte, o museu ecológico, o museu disso e daquilo, museus de tudo, como no verso do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto.

João Cabral de Melo Neto, o poeta, tem um livro e um poema que se chamam “Museu de tudo”, do poema, recupero o primeiro verso: “este mundo de tudo é museu”. E será esta, a empréstimo do poeta, a premissa da minha fala.

A todos eles cabe o dever e a missão de preservação, guarda, estudo e divulgação dos acervos. Mas não existiria o museu se não fossem os objetos, e não existiriam os museus se não fosse o desejo de selecionar e guardar alguns objetos, e não existira os museus se não houvesse o público para visita-los, vocês que aqui estão.

A história dos museus, posto que tudo tem uma história pretérita, vem dos antigos gabinetes particulares, coleções de peças ao sabor do dono, e das coleções privadas de arte, e é no século 18, na Europa, que se juntam às galerias de arte e aos gabinetes de curiosidades, os museus de história.

E é e tão somente apenas no século 20, no período pós-guerra, nos ensina o museólogo Poulot, que os museus passaram por um processo de dinamização com o aumento da procura, sobretudo, pelo público escolar. E foi na década de 1960 que o museu passou a se tornar um museu para todos.

A par de que as estatísticas apontem entre a população existente uma repartição do público em três categorias: aqueles que visitam museus com frequência, os que visitam esporadicamente e os que nunca o visitam e quiçá sabem de sua existência.

Na Europa e nos Estados Unidos, se se dividisse a população por três, cada terço representaria um destes status. Para o Brasil, perdoem-me, não tenho números. Mas voltemos ao nosso passeio pelo tempo, o tempo dos museus. E vamos perceber que o museu de hoje, do nosso tempo, século 21, não é o mesmo do século 20. Os objetos até podem ser os mesmos, mas os museus mudaram. Na verdade, eles vieram mudando desde que surgiram.

Os museus são organismos, e organismos vivos, porque seus acervos são construções perenes e mutáveis e, assim, como a história, eles andam com o tempo. E não falam só do passado, naquilo que existiu, ao que pese a existência, na cidade do Rio de Janeiro, de um Museu do Amanhã.

Esta mudança corrente dos museus está no sentido da exposição. A museografia atual exige que as coleções sejam analisadas, lidas e interpretadas de uma perspectiva mais plural. E, além disso, vivemos na inovação de um mundo digital e virtual e, se isso passa a ser incorporado aos museus, seja nos quesitos de inteligência para catalogação, guarda e conservação dos seus acervos, seja para disseminar informações sobre o acervo, ou, até mesmo, propor visitas e experiências virtuais, nada substitui, em um mundo que começa a nos levar a um mergulho muito mais no virtual, que não é palpável, ao valor do objeto físico, real, e ao valor da presença. A visita pessoal ao museu.

Se o acesso à internet nos permite a um clique visitar diversos museus do mundo e contemplar obras de arte ou conhecer o que não conhecíamos e talvez nunca pudéssemos conhecer, este é um caráter que deve ser levado em consideração, no entanto, havendo a oportunidade, nada substitui, ao meu ver, a emoção e o encanto de estar presente.

E depois de ter lido bastante sobre este tema apaixonante, ter revisitado livros de algumas exposições que visitei, coleciono-os para lembrar, devo dizer que ainda estava sem a resposta para pergunta a esta conferência. Poderia muito mais me alongar e contar um tanto mais, mas foi exatamente quando estava a caminho, que me ocorreu qual é o verdadeiro poder dos museus e que esperava aqui comprovar.

O poder dos museus está no visitante. Não é apenas o acervo a razão de existir de um museu. Os objetos no museu vivem o silêncio, são apenas objetos, e somos nós que, como também fazemos com os livros quando os abrimos que damos vida ao livro, somos nós que ao entrarmos nos museus damos-lhes vida e sentido para existir.

Então cabe a nós visitarmos os museus pois nós somos a sua razão de existir. Mas antes que eu esqueça, é preciso que ouçamos os museólogos, agora conselho deles, não meu: o poder do museu está em entregar ao visitante as chaves do percurso. O museu para permanecer vivo pede visita constante. Visitemos os museus. O poder está conosco.

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Gustavo Sobral

Sobre o autor: Gustavo Sobral

Gustavo Sobral é jornalista e escritor, tudo que escreve, rabisca e publica está disponível no seu site pessoal gustavosobral.com.br