Entrevista com Gustavo Sobral e Juliana Bulhões
Entrevista na íntegra ao repórter Henrique Arruda, do Novo Jornal, acerca da série de depoimentos publicados no veículo sobre o projeto Memória do Jornalismo no Rio Grande do Norte. Março, 2017.
1 – Como se deu a ideia de entrevistas com perfis mais experientes do jornalismo potiguar? O projeto deve se transformar em um livro, por exemplo, mais a frente?
Juliana Bulhões: Tudo começou com um problema que me deparei ao escrever minha tese de doutorado sobre condições de trabalho do jornalista em Natal e Brasília: não há publicações com visões plurais sobre o jornalismo potiguar praticado no início de sua profissionalização, ou seja, meados dos anos 1960. Ao conversar com Gustavo, que tem extremo interesse nesse tema, nossas ideias coincidiram e culminaram no projeto. A proposta é publicar o livro com os depoimentos na íntegra, e com o convite do jornalista Cassiano Arruda pra começarmos a série aqui no Novo, fizemos versões desses textos.
Gustavo Sobral: Surgiu da necessidade. A história do jornalismo do Rio Grande do Norte ainda precisa ser contada, e esta pesquisa é uma pequena contribuição ao reunir depoimentos dos seus principais protagonistas nos últimos cinquenta anos e em plena atividade. Ademais, partilho de um interesse sobre a história local e do nosso jornalismo, recentemente, pesquisei a vida e a obra de um jornalista do Rio Grande do Norte, Berilo Wanderley, que virou livro.
2 – Como vocês chegaram aos nomes dos entrevistados?
GS: Por indicação dos próprios depoentes. Alguns nomes eram recorrentes durante as falas e todos eles contam a história das redações dos jornais Tribuna do Norte e Diário de Natal antes e depois da impressão offset, considerada um marco no jornalismo do Rio Grande do Norte.
JB: Fizemos um levantamento prévio de jornalistas que atuaram em impressos a partir dos anos 1960 e 1970 que ainda se encontram em atividade na cidade; dessa lista extraímos os primeiros prováveis entrevistados. No desenrolar das conversas com os jornalistas que se disponibilizaram, observamos os nomes mais citados, verificamos quais desses teriam agenda e tempo e marcamos as demais entrevistas.
3 – Qual a maior conclusão que vocês perceberam após as entrevistas com estes perfis?
GS: Não se trata de um trabalho conclusivo, mas sim de um trabalho expositivo. Procuramos fazer um registro de memória viva para a posteridade, um registro que sirva para que o jornalismo do futuro conheça o jornalismo do passado; e para fornecer subsídios a pesquisadores que um dia venham desenvolver pesquisas sobre a nossa história – nossa, porque assim como você, somos todos jornalistas.
4 – Após as conversas pode-se dizer que o jornalismo de hoje em dia é muito diferente do jornalismo praticado nos tempos de redação desses entrevistados?
GS: O jornalismo nunca deixou de ser o mesmo: é pesquisa, reportagem e entrevista.
JB: Do ponto de vista tecnológico, tudo mudou, mas a técnica jornalística permaneceu – apesar dos enxugamentos das redações ocasionarem um jornalista que sai cada vez menos às ruas, que tem menos contato direto com as fontes e que tem menos glamour do que na época ilustrada pelos nossos entrevistados.
5 – Como vocês acreditam que estes profissionais se encaixariam nas atuais redações da capital potiguar, caso estivessem começando no jornalismo?
JB: Não por acaso, lidamos com jornalistas super capacitados, interessados e vocacionados. Não é à toa que foram tão citados. Assim, acredito que seriam exímios jornalistas em qualquer época.
GS: Com o mesmo instrumental que os capacitaram para qualquer tempo: vocação, determinação, competência, ética e um componente a mais: autoria.
6 – O que foi mais desafiador durante o processo?
GS: Se perguntar o tempo todo: por que ninguém fez isso antes? O jornalismo atual precisa se interessar pelo próprio jornalismo.
JB: Além de desenvolver o projeto com recursos próprios, foi pensar em nomes representativos sobre a época, sabendo que outros nomes importantes ficariam de fora da nossa lista.
7 – Quais as semelhanças e diferenças que vocês enxergam na prática do jornalismo comparando os tempos de redação dos entrevistados com os atuais tempos de redação?
JB: O trabalho jornalístico nunca deixou de ser desafiador. O jornalista sempre teve que conviver com recursos limitados, a pressão do tempo e os baixos salários. Assim, há mais semelhanças do que diferenças daquele tempo pra cá.
8 – Vocês pretendem empreitar uma série comparativa, por exemplo, com nomes que estejam começando na imprensa potiguar?
GS: Uma ótima sugestão de pauta que poderia ser acatada também por outros jornalistas. Precisamos produzir memória. Como disse o jornalista Geneton Moraes Neto: “fazer jornalismo é produzir memória”.
JB: Como mencionei, recebemos sugestões de fazer outros volumes com o mesmo tema, já que alguns nomes importantes ficaram de fora por falta de disponibilidade e também pra explorarmos outras gerações de jornalistas potiguares. É algo a se pensar a médio prazo.
9 – Qual a análise que pode ser feita, na opinião de vocês, do jornalismo ensinado nas duas principais universidades da cidade (UnP e UFRN) com o jornalismo encontrado nas redações de jornal da cidade?
JB: Podemos encontrar ótimos profissionais nas redações potiguares. O diploma (representando aqui a formação acadêmica) ainda se faz necessário, tendo em vista a formação teórica e técnica necessárias para o exercício ético da profissão.
10 – Hoje qual é a maior falha e o maior acerto do jornalismo potiguar?
JB: O maior acerto é a tentativa de valorização do que é da nossa terra; a maior falha é por vezes não valorizar os profissionais do jornalismo – ainda temos um dos piores pisos salariais do país.
11 – Como era a rotina de vocês durante as entrevistas? como elas eram divididas? agendadas? como os contatos foram feitos?
GS: A receita é simples. Modus operandi: um gravador na mão e um roteiro bem estudado. Ouvimos cada jornalista contar a sua história de vida profissional e neste contexto o funcionamento das redações, as práticas de trabalho etc., pois interessa registrar como se fazia jornalismo.
JB: Nós investigamos onde estariam os jornalistas listados inicialmente e pedimos os contatos deles a conhecidos. Foram vários conversas com eles, desde o primeiro contato até a revisão dos textos finais que irão para o livro.