Imagens da branquitude
Em um mundo cercado por imagens, o que calam é o que mais tem a dizer, é este o caminho a que Lilia Schwarcz nos conduz no seu livro Imagens da branquitude
“Este é um livro que trata do fenômeno social e cultural da branquitude, e que foi escrito por uma mulher branca, paulistana e judia. Esse é meu lugar de fala, e de onde me localizo.”. Não é outro o ponto de partida da historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz no seu livro Imagens da branquitude: a presença da ausência (Companhia das Letras, 2024, 432p.).
Branquitude é bom logo que se diga o que é, é, segundo a autora, “uma prática que tem sua realidade naturalizada na economia, na política, na sociedade, na saúde e na cultura.”. Portanto, é uma invisibilidade presente em tudo. Até, à primeira vista, pode parecer um conceito novo, mas não é, já foi analisado por outros que aparecem no livro. À primeira vista, também pode causar estranhamento uma abordagem de um conceito para a leitura de imagens. Mas também não é.
Escreve a autora: “vivemos um momento do uso acelerado da imagem, quando várias instituições atuam no sentido não só de produzir registros visuais, mas de perpetuá-los também. Museus, a imprensa, agências de propaganda, institutos, arquivos e sobretudo as mídias sociais invadem o cotidiano com um conjunto de iconografias que tornam ainda mais inseguros os limites entre o que representado e o que é de fato vivido”.
O que a pesquisadora propõe é enxergar para além de só ver. Olhar as imagens a fundo, entender que são construções simbólicas, marcadas pelo seu tempo e por ideologias. As imagens não são inocentes, aponta. Transmitem mensagens que não estão na superfície, por isso, é importante educar o olhar. “Afinal”, ela escreve, “ver é uma propriedade biológica que quase todos têm; já enxergar é uma opção cultural”.
Imagens da branquitude é, assim, um livro de “enxergar”. Trata da temporalidade das imagens e os seus sentidos e de como imagens que aparentemente podem parecer inocentes estão atravessadas pelo racismo. Tema não novo nas abordagens da historiadora, autora de tantos títulos que encara o racismo como um pilar nefasto da formação brasileira e que, infelizmente, perdura.
A proposta é de um passeio e se confirma. Lilia Schwarcz vai apresentando imagens e escolhendo temas que nelas habitam para dialogar. E esses temas são, ela escreve, “sapatos, mapas, alegorias, patrimônios, mães negras, sabonetes, teorias e imagens do branqueamento e da democracia racial são como que janelas para explorarmos o tema que orienta este livro”. E a forma que escolheu anda entre o ensaio ou a crônica.
O que ela propõe é enxergar a imagem como um documento não isento da mesma forma que se deve passar pelos marcos da história brasileira: de forma crítica sobre o que está posto e procurar enxergar o que está por trás, e pensar além da história dos feitos, que mascara a violência, exploração, opressão e divisão contra protagonistas que fazem parte da história e não são considerados por tal: as mulheres, os negros e os indígenas.
Processo que começa logo pelos títulos. É nos títulos das imagens, seja os atribuídos pelos autores, seja por quem veio depois, que já começa o apagamento das contradições e da violência que procuram invisibilizar. Imagens da branquitude é, assim, um convite a pensar sobre as imagens como um objeto do passado com significados que ecoam no presente.
Gustavo Sobral é jornalista, mestre em Estudos da Mídia (UFRN). É também bacharel em Direito, advogado, e, atualmente, graduando do curso de História (UFRN). Autor de diversos artigos e livros, disponíveis no seu site pessoal gustavosobral.com.br.
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