A Oficina, o transporte e as baianas
Em Recife, a aventura de uma ida à Oficina Brennand
Já se ouve os pássaros em tímidos piados. As pessoas passeiam à sombra, há palmeiras e a estrada é carroçável. As copas das arvores se abraçam, formam um telhado, e o carro vai aos saltos no indefinido do terreno. Tudo tem que ser com vagar. O caminho é um nunca chega que já introduz necessariamente os apressados à velocidade da contemplação. Choveu. É preciso enfrentar poças e um pouco de lama e o depois das curvas e voltas que a estrada mostra, a cada passo, passo a passo, nasce uma sucessão de naturezas mortas bem vivas. É a paisagem. A trepidação invade os ouvidos e já é possível avistar um cenário de construções caiadas, lago e o Capibaribe que serpenteia não distante. É um espaço de criação. Do barro, o artista extraiu a arte em formas oníricas que representam a criação das coisas e do mundo e do que está além. Percorrer as galerias da oficina ao som monástico que brota de altos falantes que não se vê é esperar que a qualquer momento como fazia em vida Francisco Brennand vá aparecer com a sua altura e sua longa barba branca para falar-nos. Ele é o ceramista que João Cabral de Melo Neto, o poeta, versejou: em que ele fogo se desateia e o ovo ou forno tem domadas de então. Andar ali é encontrar o jardim por Burle Marx e paisagens semeadas por esculturas e dizeres: Tudo flui, Heráclito; Pássaro implume não alcança o céu; O final é imprescindível em todas as coisas. Ir é se perder num tempo imemorial e partir pode se tornar um suplício, pois de tão distante de tudo não há taxi ou transporte alternativo que possa ou queira lhe resgatar. Minutos se contam numa espera por algo que parece que não virá. E duas baianas simpáticas, no mesmo desespero de quem veio esperando voltar, acodem no inesperado minuto último. Espremidos em um transporte de última hora, voltamos a trepidar na estrada no quente do calor da tarde, pois o único destino certo depois de ir é mesmo voltar. Às baianas, se agradece.