O passeio do bonde
A Rafa Rio, que nos mostrou os tantos caminhos da cidade
Imagens: desenho a mão livre do bonde sobre os Arcos da Lapa pelo autor; e bilhete frente e verso.
O solzinho vai dando um banho sobre os arcos da Lapa. O bondinho vai rangendo, se contorcendo, se balançando. Terá surgido o samba no balanço do bonde?
Passam janelas abertas, passa tudo, até as ladeiras que descem. O bonde para, toma fôlego; depois, lá vai ele, faceiro, se espremendo nas ruas estreitas e enladeiradas de Santa Teresa, remexendo, remexendo. Subindo, subindo, e tudo lá embaixo vai ficando pequenino, pequenino.
Atenção o bonde apita, passa um carro. Passa outro educado que o cumprimenta com a buzina, bibi! O bonde é mais alinhado soa como uma sineta: tlin tlin! Quem anda no bonde, tem que ser como o bonde, andar na linha. E nada de sinal de trânsito, o bonde é livre desde que ande nos trilhos. O bonde é educado e sem malandragem também para o carro que sai da garagem.
Um senhor com o cachorro para para ver o bonde passar. Uma mata bonita passa e pinta tudo de verde, bananeiras, caixas d’água sobre os telhados deitados, edifícios que crescem para baixo e o casario que se espalha pelo caminho. Tudo passa pelo bonde.
Passa a farmácia azulejada, o armazém São Joaquim. Parada. Quem tem de descer, desce; quem tem de subir, sobe. O bondinho é sobe e desce no sobe e desce. Parece que ele respirou e tome carreira, vai ligeirinho, samba nos trilhos. Haja energia. É bonde elétrico. Passa o Castelo Valentim pendurado na paisagem.
Uma palmeira altaneira assiste a tudo. Atenção: quem mora em Santa Teresa não paga. Rafa Rio explica: tudo começou em 1850, puxados a burro e o seu nome vem dos “bonds”, os antigos talões de passagem. Tá explicado! E no carinho do carioca é o bondinho, e cada um tem seu nome, é Carioca, é Dois Irmãos.
Atenção, é hora de retornar à estação. O motorneiro vira o encosto do assento, é que o bonde não anda de costas.